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O difícil equilíbrio entre a privacidade, o direito à informação e o uso de dados pessoais, técnicos, empresariais, de comunicação ou outros talvez represente um dos maiores desafios da atualidade e dos tempos futuros. Há que se enfrentar questões no plano fático conceitual e no plano jurídico. No plano fático, a variedade quase infinita de situações e a fluidez ou indeterminação dos conceitos. A começar pelo de intimidade ou privacidade. É costume entendê-la como o direito do indivíduo de não deixar que certos aspectos de sua vida cheguem ao conhecimento de terceiros. Ou, o direito de excluir de terceiros o que não se deseja tornar público. Nada mais vago e indefinido. A “vaguidad”, como disse GENNARO CARRIÓ, a zona de penumbra, é imensa, mesmo porque o âmbito da intimidade depende de um componente subjetivo individual: é evidente que as pessoas públicas o têm diminuído. No plano jurídico, é grande o números de disposições legais enfrentando a questão em duas vertentes a partir da garantia constitucional da intimidade e vida privada em confronto com diversos outros bens jurídicos de interesse público: uma a que estabelece determinadas áreas de proteção e autoriza as exceções, como, por exemplo as leis de sigilo bancário, sigilo fiscal, a LGPD (Lei geral de Proteção de Dados) que definiu dados pessoais, dados sensíveis, e outros, e as próprias disposições processuais do segredo de justiça; outra é a da instituição de infração penal para o caso da violação de determinados aspectos da intimidade, como o crime de invasão de domicílio, o de interceptação telefônica, o de violação do sigilo profissional, também autorizando casos de não incidência. Existe anteprojeto que incrimina condutas específicas de violação da LGPD. Por outro lado, em virtude da exigência democrática de transparência nos serviços públicos, consubstanciada na Lei de Acesso à Informação, a existência de publicidade obrigatória de certas atividades, como, por exemplo, a de processos instaurados contra alguém, a sua folha de antecedentes dentro de certos limites ou o registro de bens dos devedores, deixa-se de proteger a possível intimidade para dar prevalência ao interesse público. O fato é que, em cada situação, algumas certamente imprevisíveis, especialmente nesta era da informática e inteligência artificial haverá necessidade de superar o conflito de diversos diplomas legais, conflito esse aparente porque o comando estabelecido pela ordem jurídica é sempre inequívoco, cabendo ao intérprete e aplicador o deslinde da perplexidade que tantas normas convergentes parecem trazer.

Vicente Greco Filho

Jurista, advogado, sócio-coordenador da Greco Filho Soc. de Advogados, procurador de Justiça do Estado de SP (aposentado), professor sênior Livre Docente na USP e escritor de livros jurídicos

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